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Jul 27, 2023

Ignacio Julià, o único jornalista a fazer Lou Reed sorrir

O rock ensinou a Ignacio Julià (Barcelona, ​​1956) que nem tudo na vida é preto no branco. Não é nem mesmo cinza, como o uniforme dos policiais que atacaram os espectadores no final de um show de Lou Reed em Barcelona em 1975. O show e a subsequente repressão moldaram o então cineasta amador e crítico musical em ascensão para sempre; não foi um concerto, foi uma epifania. "Ele não tinha permissão para cantar 'Heroin', então ele tocou por apenas uma hora, sem bis. A atmosfera era uma panela de pressão. O público se revoltou e a [polícia espanhola] entrou", lembra Julià em Nova York, onde acaba de lançar Linger On, seu livro sobre o Velvet Underground e suas cinco décadas de entrevistas e contatos com a banda.

Seu tomo confirma o que todos na cena musical de Nova York já sabem: Julià é um deles. Ele é amigo de John Cale; Lenny Kaye, guitarrista de Patti Smith; Thurston Moore, fundador do Sonic Youth e apresentador do lançamento do livro; e tantos outros. "[É] um sonho tornado realidade", diz ele sobre o evento, realizado no lendário Algonquin Hotel.

O show de 1975 não foi o primeiro contato de Julià com a cultura americana. Um ano antes, ele foi para Michigan em um intercâmbio estudantil e descobriu que, nos Estados Unidos, havia 40 canais de televisão em cores em oposição ao preto e branco da TV de Franco. "Eu vi o impeachment de Nixon [pelo caso Watergate] ao vivo [na televisão], o que abriu minha mente para o mundo. Também [vi] Lou Reed, a essência de sua música e suas letras, que abriram [meus olhos] a assuntos tabus na Espanha: drogas pesadas, uma sexualidade diferente... Aquilo mexeu comigo."

Conhecido por comer jornalistas vivos, Reed deu trabalho a Julià quando pediu uma entrevista ao astro do rock pela primeira vez em 1977. O jornalista havia viajado de trem até a Holanda, como um peregrino em busca de um santo, para ver Reed. Logo a obsessão de Julià se transformou em profissão. “Comecei a escrever nas [revistas espanholas] Star, Vibraciones, depois na Ruta 66, onde ainda trabalho”; seus artigos também apareceram no EL PAÍS. "O rock não tem mais o poder transformador que tinha nos anos 1950 ou 1960, mas a Ruta 66 tem um público que está se reinventando." Julià finalmente conseguiu entrevistar Reed em 1980. Eles passaram a ter um relacionamento próximo

Julià lembra daqueles primeiros anos, antes de se dedicar à crítica musical ("Descobri que distribuía discos, ingressos e bebidas de graça", ele ri). Na época, escrevia sobre cinema e fazia filmes underground em super-8, como o ainda desconhecido Pedro Almodóvar. "Pedrito [Almodóvar] filmava épicos filmes romanos nos arredores de Madrid. Os curtas não tinham som e ele fazia as vozes de todos os personagens", lembra Julià, claramente divertido. A sua relação com o cinema, tal como com a música, tem sido uma constante na sua vida, graças ao cineasta Manuel Huerga, seu “amigo desde o primeiro dia de escola”. Huerga capturou o show do Velvet Suite no lançamento do livro em Banyoles (Girona), Espanha. “Fizemos o filme para nós, por amor à arte, mas a Filmin comprou para nós. Ele é feito com uma única câmera e mistura fotos de um filme meu de 1977, estilo Andy Warhol, que foi projetado durante o show. "

Para Julià, o lançamento do livro em Nova York representa o fim de um ciclo. "Não poderei repetir isso, o lançamento do filme para 120 pessoas em TriBeCa... Não tenho tempo para um trabalho de documentação de décadas [como o do livro]. Mas acho extraordinário ter sido capaz de trabalhar nisso." Ele fez isso ao ritmo da música e das letras de Reed. Julià observa que Reed "não foi apenas um astro do rock, mas um grande poeta, um grande escritor que não fazia julgamentos morais; pelo contrário, ele mostrou a relatividade das coisas, e o mundo de hoje está dando razão a ele".

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